quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Sobre uma [quase] dissertação

Ela queria ser
Talvez,
Uma dessas coisas
[abundantes de pensamento]
Não o pensar por pensar
Tinha que (há)ver com praticar
[ do endividamento com a classe]

Política,
Não que aspirasse algo simplista
Ou que a política assim fosse
Mas ela sabia fazer
[Essas coisas que chamam de política]

Intelectualidade,
Parecia ausente do ensaio da sua vida
[até então]
Titubeava palavras
Arriscava um escrito ou outro
[mas sucumbia]

Diferença,
Ela revolvia os mortos de sua cidade
[brigas e pragas, assassinatos, fome, tristeza, logo depressão]
Melindrava-se com a escola [mal] arranjada
Luto pelo menino deprecado
Ressaca pela embriaguez de seu [quase] pai
Lamento pelos parentes [quase] analfabetos
Injuria pela conservação de determinadas tradições
No trabalho [de balconista] ponderava o tempo que perdia
[vendendo algumas coisas (in)úteis]
No outro [de costureira e dobradeira] percebia o injusto salário
[que depois passou a chamar de mais-valor em seu trabalho literário]
A política veio da sua condição de classe
[Aprendeu]
Só com o grito [poderia algum dia que não se sabe] ser escutada
Gritava sempre mais alto
 [Percebeu]
O individual não poderia nada
[Juntou-se]
Na escola queria fazer grêmios, na faculdade centro acadêmico
No trabalho problematizar, na cidade mobilizar
Na vida, se organizar.

Depois,
Ainda com todos esses pressupostos
[pois nunca esqueceu de onde veio]
Primeiro,
Sentiu-se privilegiada
[estava estudada]
Segundo, empolgou-se
[um mundo de categorias a descobrir]
Outros fatos (i)numeráveis,
Se emburreceu,
[não sabia (des)embaralhar as palavras]
Se frustrou,
[metas inalcançáveis]
Entendeu,
[as coisas que na adolescência nunca leu]
Perdeu,
[um tempo que não sabia que tinha pra fazer essas coisas que chamam de cultura]
Admitiu,
[entardeceu quando Chico, Gorki, Andrade conheceu ]
E assim foi, decodificando seu não-lugar
Num devir que [com o novo namorado] aprendeu

Já não sabia,
Desembaraçar determinadas relações
E ficou nessa sempre agonia
De declarar-se incapaz de escrever
[O trabalho final]
Como se ontem tivera nascido
Como se ontem tivera conhecido
[O que chamam de palavras]

Para seu socorro
[Recordou]
Que precisava saber de teoria e prática
Continuou, com toda sua dor,
Só porque entendeu as desvantagens
Não quer dizer que não se pode ser doutor(a)


(Ellen Caroline) 

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Os dois


Despida [como diria Benedetti]
Os dois no escuro
Fissura
Pedaços do rosto
Bocas interpostas
Corpos montados
Gritos inacabados
Veemência inexplicável

[Ele]
Pele negra,
Costas [como] desenhadas,
Fome insaciável
Escritos espalhados
Olhar desregrado
Amores inventados
Sorriso [enlouquecedor] dado

[Ela]
Lábios emoldurados
Seios apoucados
Apetite deflagrado
Cabelos anelados
Poemas perturbados
Corpo esboçado
Timbre rouco

[Eles]
Noites insanas
Tardes poéticas
Brigas apaixonadas
Revoluções revigoradas

[ela] Ansiosa pra que ele chegue
[ele] Torcendo para encontrá-la
[ela] Se faz de louca e desentende
[ele] Dá um espetáculo pra depois amá-la

[Os dois]

Fazem sexo, vivem dor e amor, são loucura e paixão, ternura e confusão. 

(Ellen Caroline)

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Peppino e Chico [o menino que tinha a rádio e o menino que tinha a música]



Falemos desses episódios que não podem ser (des)ditos
Sejamos petulantes com o (não)tempo
Alcancemos o presumido gozo (im)permitido
Sujemos nossas bocas em defesa de Peppino
Quanto mais nos emporcalhemos, mais vigorosos seremos.

Catemos um entusiasmo
Desaforemos um sexo anônimo
Toleremos ser anulados,
E após dissolvido choro, grito, agonia
Sejamos insolentes, com a tal da (in)justiça.

Penetremos (des)providos de coragem
Simulemos nossa alegria
Somos (m)atados todos os dias
Mas sorrimos.

Adestrados para essa (des)ordem
Todo verso [in-verso]
Que cause comoção,
Quando a ideia é a pendencia do que não [tem]pão
Estamos bem então.

Não era para rimar, porque nem só de rima vive quem tenta fazer poemia
Diferente do cantor, que dá melodia pra ouvir quem é doutor
Pros outros, como nós, fica a questão:
o que seria de Chico se o povo tivesse o [tem]pão?
Certamente Chico (de Buarque) cantaria outros temas,

Peppino (de Impastato) musicalizaria dezenas, e eu poematizaria mais o amor.  

(Ellen Caroline)

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Cor

Desenha teus passos que te ajudo a colorir!
Parece truncado lidar com esse jeito de gostar
Nossos entusiasmos ficam confundidos a todo tempo
E já não sei pra onde fugir.

 Você se perde em meu tumulto
Eu fico pasma na tua subversão
Teu corpo escala o meu de um jeito alvoroçado
E fico me rendendo à bagunça que fazes em mim

Há coisas que me chateiam
E eu sou uma arrogante-chateada
Não sei o que,
mas estou atrapalhada por você

O que faz o meu querer-não-querer?
Pretendia também, eu, saber.
Enquanto isso me apego a você
Encenando o (des)apego

Me extravio nas conversas prolongadas
Nos poemas deixados
Nos sonhos (des)encontrados
No ritmos apresentados

Me completo com nossos corpos encaixados
Na invenção que tu faz do amor
No teu homem que me arranca
toda possível inocência

Me rendo a tua arrogância
Porque me fazes cativar com teu jeito de amar
Me rendo a você

Porque és assim!
Um complexo que me me faz colorir. 

(Ellen Caroline)