domingo, 28 de maio de 2017

Umas coisas sobre a Ana

Estava Ana...
... um tanto incomodada!

Foi apanhada de meses (a)pós dias e mais horas
De perguntas que só tratavam de inferir o limite existencial
A menina tola se abocanhava de questões
E depois definhava nas suas perseverantes (não) respostas!

Indagava sobre a relação do corpo no universo
Se perguntava sobre o lançamento das partículas ao vento
Refletia o não-lugar de tudo

Foi dessas ideias-não-lugares...
... que começou a não-achar lugar para si.
Então Ana passou a sentir solidão,
Mas não era uma solidão individual
Ela sentia solidão pelo tempo,
Pelas cidades,
Pela sua vida e a vida das outras pessoas.

A solidão de Ana era as vezes mais inusitada:
Ela a sentia na música
Nos personagens de seus livros
 Na Melancholia de Lars von Trier
 [Talvez esse último assim o quisesse fazer]

Sentia a solidão dos sonhos!
Do vazio que eles deixavam ao não existirem mais
E do vácuo que causavam mesmo quando estavam ali
[dentro de si]

Antes mesmo,
Ana não tinha essa “birra” com os sonhos!
Mas passou a acreditar que quanto mais entendia do mundo
Mais embirrada ficava com eles!

Isso porque antes mesmo de nascer,
Sua mãe, avó e demais ancestrais já tinham registrado
em suas histórias o quanto o mundo seria assustador para as mulheres.  

Também, quando já estava nascida,
Ela começou a entender que existia um tal “problema” por sua cor
Talvez os sonhos foram se esvaindo da vida de Ana quando descobriu que
assassinaram os sonhos-antepassados.

Depois,
Começou a entender outras questões,
Falavam de exploração do trabalho e suas desvantagens
Puxa vida, já não bastava ser mulher e preta!
Ana entendeu que existia um negócio que se chamava classe.
Foi aí que se deu conta que sua birra com os sonhos-solidão não era sua,
Porque bem no fim, ela nasceu no não-lugar em que não poderia sonhar.

Mesmo assim, a menina foi insistente!
Eita, mulher teimosa.
Foi lá, não sabia ao certo, mas (des)embrulhava sonhos todos os dias
Até sabia que sozinha não poderia muito
[Ana tinha solidão, mas não era burra]
Então sempre sonhava reafirmando o compromisso com seus pares-não-lugares.

Puxa vida,
Mas não é que no seu não-lugar, tudo começou a se revirar ainda mais?
A menina ficou com medo,
Em seu país, além da miséria e das mortes-mulheres-pretas-pretos-gays-pobres-trabalhadores-trabalhadoras que lhes eram históricas
Começou a surgir um tal de “tira mais do povo”


Eram várias coisas tirando
Tiravam mais comida, mais dignidade...
Arrancavam mais casas, mais empregos
Acabavam com a saúde, a educação, a previdência
Destroçavam as condições de trabalho que já não eram muito boas.

Eram coisas,
Infelizmente não estavam inanimadas...
Coisas Temer, coisas Bolsonaro, coisas JBS, coisas Odebrecht
Coisas monopólios, coisas imperiais, coisas corruptas...
... coisas que lhe davam nojo!

Ana desatinou a escrever pela vida
Primeiro jogou umas possibilidades no ar,
Percorreu sua labuta diária escrevendo-pensar
Escrevia na sala, na cama,
Escrevia no desastre da humanidade
Escrevia no mundo

Ana não sabia para que estava escrevendo,
Mas pelo menos em algum momento entendeu que essas coisas de não-lugar, solidão e medo, tinha que ver com o como apreendeu sua identidade nessa socialidade
Porque na verdade [sendo mulher-preta-pobre]

O mundo lhe dizia todos os dias: pensas que és quem pra poder sonhar?   

(Ellen Caroline)

Era só um feliz aniversário

Willian, 


Se eu fosse um orixá te daria a força de Xangó e o amor de Oxum para tu seguir teus passos com toda firmeza da terra, com a densidade das águas e com o calor do fogo...

Se eu pudesse doar memórias, te daria de presente as histórias mais bonitas de nossos ancestrais, e junto dessas histórias a beleza da nossa cor e do nosso grito...

Se fosse responsável por definir o lugar de cada coisa no universo, deixaria a lua mais perto de ti e te daria cotidianamente a energia do sol...

Se encontrasse a proteção em algum lugar menos abstrato do que o que conhecemos, a colocaria em tua mochila para que medo algum te fizesse entristecer...

Se eu desenhasse, esboçaria pelos cantos de teu inconsciente de forma colorida, todas as tuas habilidades para te fazer acreditar que um mundo é pouco pros teus sonhos ...

Se fosse música, te daria de presente a melodia do teu corpo para que tu pudesse materializar para ti mesmo a tua singularidade...

Se eu pudesse me transformar em tempo, duplicaria as horas do teu dia para que tu tivesse mais tempo para dar conta de tudo que precisa em seu cotidiano, também encurtaria a distância e dobraria os dias que podemos estar juntos para falar  e viver mais alguns poemas... Se eu fosse o tempo... te daria a eternidade como presente para a humanidade!

No entanto, com o pouco que me resta de poeta, te dou em forma de palavras todo meu bem querer por você!

E já que não posso te dar um abraço nesse dia 28, compartilho contigo - através das energias que nos fizeram chegar até aqui - o meu amor e a minha força, as minhas e as nossas memórias... Indico teu olhar para a lua agora, e te transmito meu calor junto da minha proteção... compartilho contigo um tanto dos meus sonhos, te recordo nossas músicas e te dedico um pouco do meu tempo para te desejar feliz aniversário e te agradecer por tudo que já me trouxe de bonito. 


Com carinho, Ellen. 

(28/04/2017)

Para as Mulheres!


Hoje
Um dia a mais
Um [possível] dia comum!

Como todos os outros...
Dia de trabalho,
De ouvidos atentos à histórias que se repetem!

Algumas mais jovens,
Outras envelhecidas [pela idade ou pelo cansaço]
Mudam os endereços,
Local de trabalho
Mudam os patrões, 
Os homens.

Elas seguem
Trabalhando e sendo demitidas na gestação
Cozinhando e apanhando no fogão
Amamentando e tendo que suprir as necessidade do patrão
Limpando a casa e sendo socadas no chão
As histórias são as mesmas. 

Já não sei o que fazer para conter a dor que é para uma mulher ouvir de outra mulher "ele me surrou a vida toda mas faço o que posso pra cuidar dele"; "ah entra por um ouvido e sai pelo outro"; "me bateu durante muitos anos, olha as marcas que fiquei"... tem aquelas que não falam nada mas o olho roxo mostra evidencias de uma das coisas mais cruéis. 
Lembro da mãe que sofreu violência psicológica e que arca com todas as responsabilidades pelos filhos... da avó que foi constantemente humilhada, das tias.. primas, amigas, da gente! 
Nossas trabalhadoras são assassinadas cruelmente todos os dias, quando não por morte biológica, a morte pelo gosto da vida ou a possibilidade de sonhar.
Nós mulheres vivemos com o medo... medo por todas nós. 
Se dar conta do impacto do machismo em nossas vidas é muito doloroso e encontrar estratégias coletivas para o enfrentamento é a única alternativa. 

Para os que perpetuam a ridícula ideia da fragilidade das mulheres, digo de boca cheia que somos o que há de mais forte, por sofrer, aguentar e ainda conseguir lutar historicamente para sair dessa condição. Sem as mulheres não há revolução! Por isso, dedico meu dia de trabalho a todas as mulheres que se fazem presente em minha vida, pelo trabalho ou pelos laços afetivos e compartilham comigo a coragem. Dedico minha vida a todas as mulheres que deram a vida para que muitas mulheres pudessem se manter vivas hoje.


(Escrito em 28/07/2016) 

(Ellen Caroline)